Emily O´Connell nunca imaginou que pudesse ter um toque de ouro. Herdeira de uma das marcas mais luxuosas de sapatos e bolsas haute couture do mundo, sorte e glamour praticamente correm no sangue de sua família. Um dia, porém, Emily percebe que sua sorte talvez seja muito maior do que imagina. Na manhã seguinte ao feriado de St. Patrick, após ganhar milhões em uma noite de jogatina, a garota se vê vítima de uma tentativa de estupro. O que a tira das estatísticas policiais, no entanto, é a forma como ela consegue se livrar quase magicamente do perigo. Tudo se complica quando Emily conhece o misterioso e encantador Aaron Locky. Afinal, que segredos ele esconde por trás de seus cabelos compridos e de sua risada irônica? De algum modo, Aaron exerce sobre ela uma atração irresistível, como se uma aura de poder os cercasse e os unisse. Ele tem muito a ensinar a Emily, mas, entre todas as coisas, ela nunca imaginaria que poderia estar envolvida com uma tradição secular lendária.
Gostaria de iniciar esta crítica ao livro "Por um toque de ouro", da escritora de Fantasia Fantástica Carolina Munhóz, ressaltando que, antes não tanto literária, esta será uma revisão sobre diversos aspectos citados no livro que dizem respeito à Mitologia Celta.
Como os celtas na Europa são os temas de dois livros que estou escrevendo, dada a minha grande paixão por esta cultura, aprofundei muito a minha pesquisa sobre os mesmos, durante anos, tendo inclusive viajado à Irlanda no ano passado. Sou aficionada pelos celtas e, principalmente os remanescentes deste povo na Irlanda.
Em primeiro lugar, acredito que muitos irlandeses se sentiram incomodados com a ambientação criada para a história. A Irlanda não compreende somente Leprechaus ou Dublin. A Irlanda é o país mais celta do mundo e que resisitu bravamente às incursões cristianizadoras de Saint. Patrick. Aliás, o primeiro santo padroeiro, ou santa, da Irlanda é Santa Brígida, conhecida na mitologia celta como a Deusa da Primavera. Seu culto era tão grande na Irlanda que, como aconteceu em várias regiões do mundo, eles tiveram que cristianizar esta divindade para que mais irlandeses fossem atraídos ao cristianismo.
Saint Patrick, numa primeira pesquisa na internet pode ser tido como o Santo Padroeiro da Irlanda, mas estudos históricos mostram que sua abordagem não foi nada pedagógica com relação aos clãs celtas que vivam na Irlanda quando por lá ele aportou. Pelo contrário, foi muito parecida com uma guerra contra os celtas pagãos do que uma evangelização dos mesmos, sendo que os que não se converteram teriam sido queimados nas fogueiras. Uma prática tão habitual aos "soldados" cristianizadores do Sacro Santo Império Romano.
Carolina Munhóz até descreve bem certos pontos turísticos de Dublin, mas acaba se restringindo a alguns, se dedicando a detalhar somente a Igreja de Saint Patrick com mais pormenores e deixa de lado paisagens estonteantes e realmente mágicas desta Ilha Esmeralda, como a Irlanda também é conhecida. Acredito que se o correr da história tivesse ido até os Cliff's of Moher (figura), no lado oeste da ilha, a magia transpareceria mais no livro. E deveria ter havido a inclusão dos círculos de pedra, tão presentes por toda a Europa. O mais conhecido dele é Stonehenge na Inglaterra.
Cliffs of Moher - Irlanda
Outro fator importante a se notar, e que pude perceber somente quando lá estive, é a influência da colonização viking que claramente não adentrou muito na ilha, ficando somente evidente na maneira como os nós (trama de linhas que formão padrões entremeados) celtas na parte norte da Irlanda, tem muitas referências vikings.
Nós celtas
No resto da ilha este padrões mudam, usando como modelo marcações feitas nas pedras gigantescas encontradas nos sítios arqueológicos, ou seja, espirais simples e triplas que evoluíram para a trisquele, ou triskle, onde três espirais se entrelaçam, e criando o mais famoso símbolo celta! (figura). E este é o símbolo da Irlanda, junto com os trevos de três e quatro folhas. Para os adeptos da religião da Grande Deusa ou Grande Mãe, o trstkle representa as três faces da Deusa, quando jovem, depois mulher feita e depois como anciã. As fases crescente, cheia e mingunate das luas também são relacionadas à face tríplica da Deusa.
As fases da Lua e as Faces da Grande Deusa
Até as ovelhinhas de cara preta são mais características do que os Leprechauns! E eu posso dizer que elas estão por toda parte na Irlanda!
Wooley Jumper - Um dos Símbolos Nacionais da Irlanda
Segundo Angélica Varandas, PhD em literatura medieval, no seu livro Mitos e Lendas Celtas: Irlanda, Leprechaun, na verdade, "é uma fada solitária que conserta os sapatos das fadas,gastos de tanto dançar, e protege o seu ouro". Semelhante à ela temos Cluricaun, uma fada irlandesa também solitária, "mas com menos apetência para trabalhar e mais tendência para se embriagar".
Parece claro para mim então que a figura que representa o atual Leprechaun irlandês é a mescla das duas fadas descritas anteriormente, só que transformado em um equivalente masculino da verdadeira Leprechaun.
Sendo assim, o que mais se conhece destes seres deturpados da sua essência é a fama de sapateiros, pregadores de peças, sempre embriagados e que possuem um pote de ouro no final do arco-íris. É triste para mim ver tanta deturpação de uma fada solitária do Bom Povo da Irlanda, que é como o Povo das Fadas é chamado.
Seguindo esta linha de raciocínio, temos agora que analisar o pote de ouro que parece ser uma visão deturpada do Caldeirão de Dagda, cujos poderes mágicos curariam os feridos e ressucitariam os mortos. Não dúvido de que a crença no Santo Graal tenha se originado deste mito. Mas de qualquer maneira ele até pode ser considerado a fonte de um enorme poder.
Mas diante de tudo que relatei aqui, por que pegar um ser folclórico, deturpado e colocá-lo como um mito importante dos celtas irlandeses?
Por que não se inspirar nos romances de Nora Roberts como "A trilogia do Coração" (The Gallagher Brothers of Ardmore, onde o Rei das Fadas tem que fazer com que estes irmãos, personagens maravilhosos, encontrem o amor de suas vidas e assim poderá libertar o grande amor do Rei da Fadas, já um fantasma que não podia deixar sua casa natal.
Trilogia do Coração de Nora Roberts
Ou então a Trilogia do Círculo de Morrighan, mais recentes, onde humanos super dotados, convocados pela Deusa Morrighan a lutarem contra as trevas que tentam dominar o mundo.
Trilogia do Cículo - Nora Roberts
Ou então a Trilogia do Círculo de Morrighan, mais recentes, onde humanos super dotados, convocados pela Deusa Morrighan a lutarem contra as trevas que tentam dominar o mundo.
Tento lido tanto sobre isso, fiquei realmente decepcionada com esta nova trilogia de Carolina Munhóz. Seu livro anterior, O Reino das Vozes que não se calam, escrito junto com a atriz Sophia Abraão, foi bem escrito e estruturado e os personagens eram mais profundos.
Neste novo livro, a personagem principal carece de qualquer atributo que a faça trilhar o Caminho do Herói (Joseph Campbell, o mestre da Mitologia atual e que influenciou George Lucas quando ele criou Star Wars). Ela pode ser muito rica, mas parece demais com as irlandesas que observei durante a minha viagem, superficiais e preocupadas com a beleza. Um choque para quem tinha vindo de Paris, onde as francesas tem uma classe e glamour quase como se fosse de nascença, por mais simples que fosse o look delas. Dois grandes contrastes.
E para não dizer que falei das flores, chegamos aos nomes dos personagens, que à exceção de três jovens milionários, fogem de qualquer sentido. Porque utilizar nomes ingleses nos personagens se eles são irlandeses? E os poucos que são, se referem a divindades obscuras da mitologia celta.
Li este livro em três horas e fiquei tão decepcionada que não sei se lerei os próximos. Mas ao mesmo tempo tive que redigir esta crítica. A Emily tem que se transformar em heroína!
Carol, se você ler este texto espero que compreenda o meu ponto de vista e se lembre daquela fã que na Bienal do Livro 2014, em São Paulo, lhe contou que tinha acabado de chegar da Irlanda...
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